domingo, 10 de julho de 2011

Capítulo 3 .

“ Porra, quem Diabos será?! “ Acordei por causa do toque da campainha, levantei meio puta pelo sono interrompido, e abri a porta.
- Olá querida! Como vai?
Era a senhora Bulamarque, com aquela voz fina, trazia um prato em mãos, e sorria aquele mesmo sorriso meio escancarado que eu via todos os dias pela manhã, quando saía para o trabalho.
- Boa tarde senhora Bulamarque! No que posso ajudar?
- Oh! Já passa das 7 minha filha! Boa noite! Eu vim trazer algo para você comer, e também vim para ver como estás!
- Acho que não precisava se preocupar  assim senhora, estou bem, sério!
- Comida e cuidados nunca são demais minha filha!
Me entregou um prato coberto e saiu caminhando em direção ao seu apartamento, sempre falando sozinha, coisas que eu nunca consegui entender. Quando levantei o pano que cobria o prato, vi um pedaço grande de frango, vários legumes e verduras, uma grande quantidade de purê de batata e macarrão. Não comi. Tomei banho e saí, enquanto caminhava em direção ao ponto de ônibus pude ver pessoas saindo da igreja. “ Puta merda! Hoje é domingo! “ Pensei . “ Amanhã vou ter que ir para aquela maldita lanchonete, me sujar com aquela gordura nojenta e ter que olhar para aqueles clientes malditos, que só sabem comer e falar alto! “ .
Um sonoro “ bi bi “ me fez pular de susto, quase fui atropelada por um corsa 95 de cor cinza, minha vontade era gritar e esmurrar o dono daquela porcaria, mas talvez não valesse a pena, não com o dono de um corsa 95, carro feio da porra! Avistei o botequim da esquina ( nome que eu mesma dei, por não conseguir ler o que estava escrito na placa, devido a grande sujeira que continha ), entrei e fui me sentando no mesmo lugar de sempre, o barman chamava-se Bill, era loiro, tinha os olhos claros e a pele bem branquinha, tinha um sotaque engraçado porque veio da Suécia. Pedi o de sempre: um copo bem caprichado de tequila! Bebi vários copos,e minha cadeira parecia dançar embaixo de mim quando resolvi ir embora. Saí do boteco e caminhei em zig-zag até tropeçar e cair violentamente sobre uma poça d’água. Em meio aquela água suja comecei a rir e pensar no ridículo daquela situação, foi quando meus olhos pousaram sobre uma pequena caixinha marrom, que era justamente onde eu tinha tropeçado, levantei e balancei as mãos para enxugá-las, segurei a caixinha e permaneci alí, olhando fixamente pra ela,esperava o dono aparecer e reivindicar a posse da caixa, mas nada aconteceu, então segui meu rumo, em direção ao meu apartamento humilde. Acho que não andei mais rápido em direção ao meu Prédio, por estar bêbada, mas mesmo assim, a curiosidade tomava conta de mim. O senhor Onório assustou-se ao me ver toda suja e molhada, quis saber o que tinha me acontecido, mas nem lhe dei ouvidos, e ele, logo percebeu minha embriaguês, calou-se e fez a gentileza de chamar o elevador pra mim, não gostei do modo como ele me olhava, era como se tivesse pena, mas pena porque? Quem deveria ter pena dele, era eu! Afinal, era um senhor solitário que nunca tinha nem um tipo de diversão, a não ser cuidar de suas plantas e pássaros. Quando o elevador chegou, entrei e dei boa noite ao senhor Onório sem ao menos olhar pra ele. Ao chegar no quarto abri a caixa e vi um papel com dois números de telefone sem identificação e uma foto de um bailarino, diga-se de passagem, muito bonito,  parecia estar em um recital, com muitas luzes ao seu redor, pessoas aplaudindo e um cenário muito elegante. Não sei porque, resolvi que ia ligar para os dois números no dia seguinte, não sabia o que ia dizer, e nem o que iria ouvir, mas que diferença faria? Eu não tinha nada de melhor para fazer, a não ser ir para aquela lanchonete maldita, me sujar com toda aquela porcaria. Andei em direção a cama com a caixa na mão, deitei-me e a pus do meu lado, peguei a foto e olhei-a fixamente, acabei dormindo, com ela alí, em cima do meu seio esquerdo. 

domingo, 3 de julho de 2011

Capítulo 2 .

Meu apartamento se situava em uma zona não muito nobre da cidade, na verdade, meu bairro era bem escroto! O prédio era amarelo, 5 andares apenas, 2 quartos em cada andar, sendo que no último, existia apenas um, no qual o dono do prédio morava . Eu morava no quarto 3, ao lado de uma senhora loira, muito baixa, que falava em tom fino e sempre se vestia com roupas rosadas, era a senhora Bulamarque, que também era viúva. No andar de baixo, havia uma mocinha, chamada Cecília, que nunca estava em casa, pois sempre foi muito estudiosa, e as horas em que não estava na faculdade, estava na biblioteca mais próxima, aperfeiçoando seus conhecimentos. Ao lado de Cecília , no apartamento 2, morava um casal muito apaixonado, Ariane e Gustavo ( ou será que era Guilherme ? ), sempre estavam juntos, sempre se abraçando e se beijando, sempre naquele clima de eterna lua-de-mel . Isso sempre me irritava bastante, não sei se era pelo fato de eu não ter um romance daquele tipo, ou se era por eu achar tudo aquilo uma grande palhaçada fingida e ensaiada. O dono do prédio se chamava Onório, era um senhor elegante, sempre muito prestativo, e quando eu, por embriaguês, esquecia de pagar o aluguel, ele gentilmente me mandava um bilhetinho que sempre dizia a mesma coisa: “Não pretendo lhe incomodar senhorita, só para lembrá-la, a data para o pagamento do aluguel já se esgotou. Lhe aguardo quando puder conversar sobre tal assunto! Tenho um bom dia“  . Eu nunca soube ao certo se o senhor Onório tinha alguma esposa, namorada ou sei lá o que. Sempre estava sozinho, com seus livros e suas plantas, cantarolando e assobiando. Meu apartamento era simples, poucos móveis, poucas roupas, pouca comida, nada de mais. Mas era o meu lugar, minhas ressacas eram curadas alí, minhas dores, mágoas, e tudo mais. Meu quarto era arrumado, eu adorava colocar incensos de lavanda por todo o canto, me fazia lembrar da casa em que cresci.
Quando entrei no prédio, pude ver senhor Onório na sua velha rotina de todos os dias, regando suas plantinhas e assoviando a mesma canção alegre de sempre. Segui para o elevador e enquanto a porta se fechava, o vi acenando com uma das mãos, ainda suja da terra. O caminho para o meu quarto nunca pareceu tão longo, o prédio parecia ter 20 andares, ao invés de 3. Quando finalmente cheguei, abri a porta do quarto, me atirei na cama sem ao menos tirar os sapatos e dormi. Sonhei com todas as coisas da minha infância, com a minha velha casa, que tinha um quintal muito grande, cheio de flores que traziam um cheiro delicioso pra dentro da sala. Lembro de sempre odiar o meu nome, Olga Ferraz, nunca me soou bem. Sonhei com meus cadernos de anotações, onde eu escrevia minhas histórias, eu sempre quis ser escritora. Acordei com o coração apertado, cheio de lembranças boas, querendo nunca mais acordar, levantei-me e fui até a cozinha, abri a geladeira procurando algo para comer, encontrei metade de uma goiabada, suco de cereja e um pedaço de bolo, que não lembro ao certo quando deixei alí. Me acomodei no sofá, e fiquei vendo TV, confortavelmente encostada sobre um travesseiro que a senhora Bulamarque fez pra mim, adormeci novamente.
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Olga Ferraz nasceu em Malta, uma cidade de interior, com poucos habitantes, onde todos se conheciam, cheia de casinhas coloridas, árvores, pequenos lagos e ladeiras que não acabavam mais. Olga teve uma infância tranqüila, filha única, sempre desejou ser escritora, escrevia seus contos em um belo caderno, estudava em uma escola só para meninas. Quando tinha 17 anos, sua mãe faleceu devido a um problema intestinal, e seu pai, perdido diante de tal tragédia, sumiu no mundo, deixando-a sozinha. Começou a trabalhar cedo, ajudava na floricultura de Dona Amália, ganhava comida, dinheiro e de vez em quando juntava pequenos buquês de flores para enfeitar a casa onde morava. Ao chegar na fase adulta, mudou-se para Bela Serra, onde empenhou-se em publicar um de seus livros, sem sucesso em nem uma das tentativas. Começou a beber para aliviar a sensação de derrota que tomava conta do seu corpo toda a vez que tomava um  “ não “ como resposta, uma sensação que se tornou permanente depois de um tempo,  sensação que não deixava transparecer, sempre odiou demonstrar fraqueza, não importando a situação. Arrumou um emprego em uma lanchonete, se instalou no apartamento amarelo do senhor Onório, e alí ficou, sem perspectiva de quando iria sair. Nunca deixou de escrever seus contos, e os enviava paras as editoras, acreditava que um dia iria conseguir publicar um deles.